* Texto gentilmente cedido por Vinícius Baião, da revista Crase
Vinte cinco anos após o lançamento do primeiro álbum daquela que é considerada a mais importante banda do rock brasileiro, a Legião Urbana, foi lançada pela Editora Record, uma coletânea de contos inspirados em músicas do grupo brasiliense. “Como Se Não Houvesse Amanhã”, organizado por Henrique Rodrigues, reúne 20 escritores contemporâneos que tiveram como encomenda a criação de ficções a partir de suas letras preferidas. Segundo o organizador, na apresentação da obra, houve apenas um único critério para a seleção dos escritores: todos serem “assumidamente fãs da banda”.
Nascidos, em sua maioria, entre as décadas de 70 e 80, é inegável que os autores em questão possuem grande relação afetiva com a banda, responsável por momentos marcantes em suas próprias experiências de v ida, seja no colégio, cantando Faroeste Caboclo durante o recreio com os amigos de turma, seja se recuperando de um final de namoro ao som de Por Enquanto, confirmando, pela primeira vez (possivelmente de mui tas outras), os versos “sem saber / que o pra sempre / sempre acaba”. Desta maneira, ainda que em tons ficcionais, alguns contos parecem carregados de elementos pessoais, indissociáveis das trajetórias particulares dos escritores, sendo aquilo que Adorno chamou de memória afetiva, indispensável às grandes obras.
“Como se Não Houvesse Amanhã” é estruturado segundo a sequência cronológica dos álbuns do grupo – todos os álbuns da banda estão contemplados com ao menos um conto. O organizador afirma que não houve determinação para que os autores se dividissem de forma a contemplar a totalidade dos discos, sendo este fato fruto de “sorte ou coincidência”. Os contos, que levam como nome o título da própria música inspiradora, também respeitam a ordem em que as canções aparecem nos álbuns.
Apesar dos textos estarem todos ligados pelo signo da Legião, as histórias são bastante diversificadas entre si, abordando uma pluralidade de temáticas, que bem representa a diversidade de vozes da literatura contemporânea. Os diferentes sujeitos possíveis na atualidade estão presentes em contos que tratam de questões próprias deste tempo, sejam nas relações familiares, na sexual idade, na indignação social ou na compreensão de mundo. Os textos também não se limitam ao universo das letras do grupo, sendo estas, frequentemente, apenas um mote inicial para o enredo a ser desenrolado. Em alguns casos, o conto surge a partir não de toda a música, mas de alguns de seus versos.
Entre os contos, destacam-se Eduardo e Mônica, de Rosana Caiado Ferreira, com a sofrida separação do casal mais famoso da música brasileira; Faroeste Caboclo, de Carlos Fialho, onde é narrada uma nova saga de João, agora advogado, carregada de violência, ambição e sexualidade; e Pais e Filhos, de João Anzanel lo Carrascoza, que apresenta a distante relação de um filho com seu pai, permeado por citações bíblicas, num claro contraponto à relação de Deus-pai e Jesus Cristo-Filho.
Enfim, trata-se de obra fundamental para os amantes da obra de Renato Russo, pois a leitura dos textos presentes em “Como Se Não Houvesse Amanhã” reafirma o caráter atemporal das canções da Legião Urbana, que, generosas, permitem serem transcendidas por outras belas obras, sem se perder sua poética original.
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